domingo, 22 de julho de 2012

De cabo a rabo. Parte 1

Em jeito de redação da escola vou contar a minha impressão por países. Durante a viagem, a net não abunda e não há grande paciência para ciber cafés, por isso aqui vai, diretamente do meu sofá!




França - As melhores áreas de repouso de auto-estrada. As auto-estradas mais caras, mais de 100€ de portagens para cerca de 1000km
Os franceses todos a ir de férias e a entupir as estradas do sul, tanto à ida como no nosso regresso.
Na zona de Irum, o meu pai contou-me a história do pai dele, meu avó, que morreu muito antes de eu nascer. Por várias vezes o meu avó imigrou para França e não só. A primeira vez, antes de casar, e no período entre guerras, veio clandestino numa viagem que durou meses. Parte da viagem era feita a pé, principalmente as zonas de raia. Em Irum, trabalhou durante uns tempos para ganhar para continuar viagem. Trabalhou em agricultura para um fazendeiro. Uma noite teve de fugir do patrão, juntamente com o amigo que o acompanhava, de alguma forma perceberam que o patrão os queria tramar obrigando-os a trabalhar sobre chantagem de denúncia. Anos mais tarde voltou, desta vez com um passaporte comprado a um vizinho, trocavam-lhe a foto e com uma martelada numa moeda em cima da foto fingiam o selo branco. Durante os anos que durou essa viagem chamou-se José Padeiro, o nome do vizinho. A guerra civil de Espanha e o início da segunda guerra mundial trazem-no de volta a casa e à família. O seu nome era Manuel Nogueira, bisavó do seu homónimo meu filho mais novo.

Itália -  Aqui um litro de gasóleo custa1.64 € em self-service; se for posto pelo empregado custa mais 13 cent.

Eslóvenia - A multa dos 150 € acabou com as aspirações de crescimento económico através do turismo deste país. Antes de ser multado eu tinha dado à Eslovénia a classificação de "país mais bonito da Europa", depois da multa retirei-lhe essa classificação. Conclusão: os milhares de leitores deste blog já não vão passar férias à Eslovénia... bem feita! a culpa é do polícia que me multou.
O desenvolvimento trazido pela entrada na união europeia é bem visível nas auto-estradas e no renovado parque automóvel. Há uns anos atrás, quando por aqui andei, só se viam Yugos e Zastavas, carros de fabrico Jugoslavo, agora já não se vê nenhum!

Croácia - O interesse deste país é mais a sul,  nas zonas de costa do Adriático. O norte que atravessa- mos são planícies agrícolas sem fim, milho, girassol e algum trigo. Espantou-nos a quantidade de girassol que vimos durante toda a viagem em quase todos os países, atirando um número para o ar, 90% dos campos cultivados que vimos tinham girassol o que corresponde a 20% de todos os campos que vimos. Para que será tanto girassol? Biodisel? Não faço ideia.

Sérvia -  Milho e girassol a perder de vista. À entrada de Belgrado estavam a desviar o transito por causa de obras, de maneira que só vimos o Danúbio muito mais tarde em Budapeste. Ainda há Yugos e Zastavas do tempo do General Tito.
A parte final da viagem na Sérvia, antes da Bulgária, é feita por uma estrada estreita através de um desfiladeiro fantástico, numa zona muito rural. A auto-estrada vem a caminho...



Bulgária - O primeiro país novo para mim nesta viagem, o meu pai já conhecia. Foi uma agradável surpresa. Paramos em Sófia, uma cidade bonita moderna e tranquila. Um simples gesto fez com que ganhasse a destinção de país mais simpático da europa. Parei a Berlingo na praça central de Sófia, estavamos mortos por uma cerveja fresca de fim de tarde quente. Quando estacionei, quis pagar o lugar a uma senhora que guardava o parque, dei-lhe um euro porque não tinha Lev´s a moeda local. A senhora não aceitou e no seu melhor Búlgaro mandou-me ir cambiar a moeda ou então mandou-me à fava... não entendi bem. Ao meu lado, uma moça, vendo a minha cara de "acabadinho de chegar e já pronto a bazar" sorriu para mim e deu uma moeda à senhora do parque, pagando o meu estacionamento. -Thanks, you are very kind... thanks a lot.
Sófia.
E assim a Bulgária ganhou o prémio de país mais simpático da Europa.


 Turquia - A meta da 1ª etapa da nossa viagem! a 1ª e a única etapa porque o resto estava no ar...
Istambul é de facto uma cidade incrível a não perder, gostei particularmente da zona ribeirinha do Bósforo, a agitação nas águas e as pessoas... muitos turistas  do mundo árabe, mulheres de burca a tirarem fotografias! A Mesquita Azul, a Catedral de Sta Sofia, o hipódromo...
Ficamos dois dias e uma noite em Istambul, recuperamos força e seguimos viagem Turquia dentro.

Um blindado anti-motim nas ruas de Istambul.

O Bósforo, a ligar o ocidente e o oriente, e a fazer-nos sonhar com rotas de seda.
A Turquia é um gigante em todos os aspetos a começar pelo tamanho; tem 1500km de comprimento, faz fronteira com uns sete países, entre eles o também gigante Irão, e com a Síria, neste momento a ferro e fogo.
Exceto Istambul, andamos sempre fora das zonas turísticas e provavelmente as mais bonitas, pelo que, para mim, o país foi um bocado uma deceção, achei as paisagens pouco interesantes e os rios muito poluídos.
A Turquia é um monstro económico, os camiões turcos (e também os Iranianos) dominam os países vizinhos, não que isso seja um indicador económico... há obras gigantescas em todo o lado, milhares de quilómetros de auto-estradas e vias rápidas de duas faixas. A ideia que tinha que a Turquia queria pertencer a União Europeia, transformou-se na ideia de que a União Europeia queria pertencer à Turquia.
O último dia de Turquia fizemo-lo por uma garganta enorme de muitas centenas de quilómetros com rios serpenteantes, entre Erzurum e Batumi. Aqui as auto-estradas, tuneis e viadutos estavam em construção, perturbando o vale e os poucos automobilistas. Aqui a paisagem era de facto de cortar a respiração. Havia alguma agricultura nas margens dor rios em pequenos terrenos muito fertéis, nalguns locais os legumes produzidos eram transportados de um lado para o outro do rio por tirolesas montadas em cabos de aço. No final do vale perto do Mar Negro, o clima muda radicalmente e a zona aparenta-se tropical, nas vertentes empinadas produz-se chá.







Geórgia - Entramos no país pela fronteira de Batumi. Welcome to Georgia, dizia a simpática polícia na fronteira. Enquanto esperava numa fila interminável de carros para passar a fronteira, cruzei várias vezes o olhar com uma jovem polícia que trabalhava num guiché próximo. Quando chegou a nossa vez de mostrar os passaportes foi uma colega dela que nos atendeu. A curiosidade da primeira fê-la aproximar-se, chegou-se perto da amiga, olhou para mim sorriu e disse - olá (suponho que em Turco) eu sorri também e respondi-lhe com um Hello. A amiga que me atendia riu-se e disse também um hello, depois trocou umas palavras com a colega em Georgiano, que eu depreendi que fosse - «hello,  nem todo o mundo é turco». (A maioria dos que por aqui passam são turcos... elas acharam piada aos europeus!) O meu pai já não se calou mais com a frase: «Nem todo o mundo é turco.»
Batumi é o local de todas as excentricidades. Era e ainda é local de férias de russos ricos, casinos e hotéis chiques. Estão por toda a parte, a arquitetura dos edifícios é arrojadíssima, quase a cair no ridículo, tem tambem edificios antigos com muito charme e muitíssimo bem recuperados, a cidade é bonita, para quem gosta do estilo mas tem pouco que ver com o resto do país. Ficamos presos por causa do problema da embraigem e tivemos de lá passar dois dias...

Ao fundo a torre do Sheraton.

Neste parque não querem pessoas sem trela nem cães com trela.

Old and new Batumi, lado a lado.

























 
A Geórgia é também a terra natal do Xico Esperto ao volante. Nós, tugas, ao pé destes gajos, somos uns meninos! É verdade. o xicoespertismo começa  a fazer-se sentir desde a Sérvia e ocupa toda a região do Cáucaso. Quando vinhamos na Sérvia descansadinhos numa auto-estrada a 130, passa por nós um gajo pela esquerda a 200 e logo a seguir um pela direita (pela berma) a 210. Ficamos incrédulos... mas é aqui que o xicoespertismo atinge o seu expoente máximo. Na estrada, o objetivo de qualquer condutor é ultrapassar o carro que vai à sua frente, mesmo que a seguir tenha de fazer uma grande travagem porque passou o sítio onde queria parar. Tivemos cenas completamente hilariantes e de uma infantilidade atroz...
O país é bonito, muito verde, muitas montanhas, muitas florestas, muitos rios (poluídos) aldeias pobres, rurais e isoladas.Tem uma capital faustosa, Tiblisi, muito europeia e com muitos edifícios estilo Expo98.

Alfabeto Georgiano. Dissem que os caracteres são inspirado nas formas das vides. Segundo os Georgianos foi na Geórgia onde se fez vinho pela primeira vez.

Arménia - A Arménia encheu-me as medidas, foi o país que mais gostei. Era exatamente o que vinha à procura, gente simpática, todo o tipo de paisagens, encontros imediatos de terceiro grau... Vimos vários monumentos, há muitos por todo o lado, destaco dois, um Caravanssarai do tempo da rota da seda muito bem conservado, era o abrigo de pessoas e animais que comerciavam na região, mil anos de história e a recordar-me o livro de Amin Maalouf, "O Périplo de Baldassare", outro monumento foi uma igreja/mosteiro que visitamos depois de pular a cerca, era fim de tarde e a fraca luz deu uma visão misteriosa ao local, muito bonito e mágico.
















O Caravansarai.
Da Arménia fica também a visão das unidades industriais deixadas pelos Soviéticos. Por todas as terras e cidades existem verdadeiros monstros ferrugentos, vestígios arqueológicos industriais a testemunhar um passado bem diferente do atual presente. A URSS deixou por todo o lado fábricas, fundições, refinarias e uma infinidade de outros vestígios, bairros operários gigantescos, estruturas sociais... Passamos um vale encaixado, cheio de fábricas, as casas dos trabalhadores ficavam fora das zonas industriais em terrenos mais elevados, havia teleféricos para transportar os trabalhadores para os seus bairros. Também o parque automóvel é inteiramente contemporâneo das fábricas.
Na Arménia os polícias são também genuínos, gostam do seu suborno como deve ser! Sempre que andavamos dentro de localidades, tinhamos de perguntar a direção a seguir a cada cruzamento, não há placas a indicar nada e as que há são escritas num alfabeto indecifrável. Numa das muitas inversões de marcha que tivemos de fazer, a polícia estava à coca e mandou-me parar. O gordo do polícia olhou a matrícula da carrinha e coçou a cabeça, chegou-se a pé de mim e a primeira coisa que disse foi "50 dólares". Fez uns gestos a dizer que eu não podia ter feito aquela manobra. Depois de muita conversa no meu melhor arménio, lá lhe ofereci um relógio dos ciganos e ele ficou todo contente.








Autocarro a gás, as garrafas de gás vão no tejadilho.

No gigantesco planalto por onde entramos no país.


Monte Ararat.
O meu pai cantarolava:
 ♫"A lá santé de Noé
patriache ensigne
le premier qui a planté
sur terre la vigne..."♫

Vendedores de cogumelos e fumadores de cigarros.

Atravessamos o país de norte a sul e depois em sentido contrário, por estradas diferentes. Passamos junto do lago Sevan, um lago gigantesco rodeado de montanhas no interior do país. A paisagem é linda.
Lago Sevan. Adoram toalhas da Mini...
Alfabeto Arménio. Tomem nota que pode dar jeito!
A Arménia e a região vale a pena visitar, tudo está em mudança rápida e dentro de poucos anos os Mcdonadls, ikeas e decathlons invadirão a região... no entanto, e apesar do aparente apaziguamento conseguido nos tempos da união soviética, o Cáucaso é a zona de vinganças ancestrais e de guerras fratricidas, um barril de pólvora entre montanhas obscuras, lendas e profundas tradições.

(Continua)

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